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LYDIA CONDÉ LAMPARELLI

LYDIA CONDÉ LAMPARELLI

LYDIA CONDÉ LAMPARELLI (1936)

 

Lydia Condé Lamparelli nasceu no dia 04 de novembro de 1936 em São Paulo, SP. Foi nas décadas de 1960, 1970 e 1980 que ela esteve ligada ao ensino público paulista, no desenvolvimento de materiais e projetos para a formação de professores. Suas atividades podem ser vistas em autoria de livros didáticos, na elaboração de propostas curriculares e de materiais subsidiários ao ensino, entre outras atividades, em que foi sendo constituída sua expertiseprofissional.

Licenciada em Matemática pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, inicia sua carreira profissional em 1960, como docente do Curso Colegial do Instituto Estadual de Educação Alexandre Gusmão. No ano seguinte, presta Concurso de Ingresso da Secretaria Estadual de Educação de São Paulo, logrando aprovação. Em 1963, por um convênio vigente entre a Secretaria de Educação e o Instituto Brasileiro de Educação Ciência e Cultura (IBECC)[1], afasta-se do cargo de professora e inicia suas atividades naquele instituto, onde então foi convidada para formar uma equipe de Matemática (LAMPARELLI, 2018).

O trabalho realizado por Lydia Condé Lamparelli já foi analisado também em dois trabalhos que investigaram a sua trajetória profissional. O primeiro deles refere-se à tese defendida por Gilda Lucia Delgado de Souza, intitulada “Educação matemática na CENP: um estudo sobre condições institucionais de produção cultural por parte de uma comunidade de prática”.

Na tese de Souza (2005), tem-se como uma das professoras entrevistadas a professora Lydia Condé Lamparelli, donde tem-se a informação de que foi na CENP que ela pôde desenvolver na prática, os conhecimentos adquiridos durante um estágio que realizou na França, no Institut National de Recherches et Documentation Pédagogiques (INRDP). A partir dos saberes que foram tratados nesse estágio, Lydia elaborou o material intitulado “Atividades Matemáticas 1 e 2” (SOUZA, 2005, p. 164).

A experiência com livros didáticos de Lydia Condé Lamparelli, segundo Souza (2005), começa no tempo em que fazia parte do IBECC, a partir de tradução e adaptação das obras do School Mathematics Study Group (SMSG) para a língua portuguesa, o que possibilitou à professora Lydia o primeiro contato com um “novo tipo de ensino da Matemática” (SOUZA, 2005, p.142). Em Lamparelli (2018), esse fato é assim descrito:

 

Havia livros dirigidos para a formação dos professores e livros didáticos para os cursos ginasial e colegial com os correspondentes guias para os professores. Esses livros permitiram que eu tivesse contato com um novo tipo de ensino da Matemática. Aliás, eles não usavam a expressão Matemática Moderna, mas sim Matemática Contemporânea. Tinham muita influência do Prof. Howard Fehr, que não era do S.M.S.G., mas sim do National Council of Teachers of Mathematics (N.C.T.M.). Esse material contribuiu de modo significativo para minha formação pois aprendi muita coisa que não havia visto na Faculdade (LAMPARELLI, 2018).

 

O contato com os livros do SMSG é um aspecto comum que pode ser lido nos estudos biográficos de Lydia Condé Lamparelli, que afirma ser um ponto de partida fundamental na sua formação como professora de matemática, por se tratar de saberes não veiculados em seu curso de formação inicial. Lamparelli (2018) relata que, em parceria com o Prof. Lafayette de Morais, foram traduzidos e adaptados quatro livros e guias para o curso ginasial e três guias para o curso colegial do SMSG (LAMPARELLI, 2018, p. 267).

Um outro trabalho sobre Lydia Lamparelli refere-se a um capítulo do livro “Educadoras Matemáticas: memória, docência e profissão”, organizado por Wagner Rodrigues Valente. No texto dedicado à Lydia Lamparelli, os autores Antônio José Lopes e Denise Medina trataram de aspectos pessoais e profissionais dessa professora, à luz de entrevista por ela concedida a esses pesquisadores.

De acordo com Lopes e Medina (2013), o início da carreira profissional de Lydia Condé Lamparelli coincidiu com intensas mudanças ocorridas nos programas e no currículo das escolas, decorrentes da introdução dos estudos desenvolvidos por Jean Piaget sobre aprendizagem e metodologias alternativas, e na penetração do ideário do Movimento da Matemática Moderna (MMM) no Brasil.

Lydia Lamparelli desenvolveu diversos projetos no tempo em que esteve ligada ao ensino público paulista nos anos 1970 e 1980, que sobremaneira foram utilizados na formação de professores paulistas, tendo como ponto de partida a coordenação da elaboração do currículo de matemática consubstanciado nos Guias Curriculares para o ensino de 1º grau(1975)[2], um ponto de partida para caracterizar a personagem com expert. Nesse trabalho há um desenvolvimento de uma expertise profissional a serviço de uma instância governamental, cujo trabalho se constituía numa atribuição de ordem prática: desenvolver um novo currículo para a escola de oito anos.

Os Guias Curriculares para o ensino de 1º grau (1975) foram uma publicação oficial construída especificamente para o ensino no estado de São Paulo, no contexto educacional após a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases para o ensino de 1º e 2º graus, lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971. Constituintes como parte do Plano Estadual de Implantação da escola de 1º grau, foram propostos sete guias que estruturavam o currículo: Língua Portuguesa, Educação Artística, Educação Física, Estudos Sociais, Ciências, Programa de Saúde e Matemática.

O Centro de Recursos Humanos e Pesquisas Educacionais “Prof. Laerte Ramos de Carvalho” – CERHUPE, órgão criado em 1973, assumiu a tarefa de revisão e organização do currículo, antes feita pela extinta Divisão de Assistência Pedagógica – DAP, da Secretaria da Educação do Governo de São Paulo. De acordo com texto introdutório dos Guias Curriculares, escrito pela Prof.ª Therezinha Fram, então diretora do CERHUPE, houve uma demanda de recrutamento de professores para a produção de tais guias:

 

Caracterizada a escola de 1º grau, mais definidamente puderam ser estabelecidas as diretrizes gerais para a construção do currículo. Em seguida, procedia-se ao recrutamento de especialistas para realizá-la. A constituição das equipes traduzia a preocupação de ver assegurada uma visão total do processo escolar: seus membros somavam experiências, abrangendo todos os graus de ensino vigente – primário, secundário – ginasial e colegial – e superior (SÃO PAULO, 1975).

 

É possível perceber no excerto acima a ação do Estado para convocar pessoas que fossem capazes para a resolução de um problema prático – a construção de um currículo para a escola de oito anos, nesse caso. Considerava-se então, de acordo com o mesmo texto, que a expertisenecessária para desempenhar essa tarefa seria possuir formação superior e somar experiências em todos os graus de ensino. Foi nesse contexto que a equipe técnica, formada por Lydia Condé Lamparelli, Anna Franchi e Almerindo Marques Bastos e mais de 31 professores colaboradores, deu início a esse texto curricular para subsidiar o ensino de matemática paulista, trazendo aspectos do Movimento da Matemática Moderna, cujas recomendações estavam alinhadas com ideias de matemáticos do mundo inteiro que, nos últimos anos, vinham se preocupando com a Pedagogia da Matemática, tais como: Caleb Gategno, Emma Castelnuovo, Georges Papy, Zoltan Paul Dienes, Lucienne Felix e o psicólogo Jean Piaget.

Seguindo uma proposta tecnicista, os textos teóricos do Guia Curricular, popularmente conhecido como “Verdão”, trouxeram elementos do Movimento da Matemática Moderna, que estava calcado nas estruturas matemáticas com lógicas mais formais e abstratas para o ensino. Como essas propostas ficaram um pouco distantes da realidade das salas de aula, houve a necessidade da escrita de um novo material que pudesse traduzir a linguagem teórica dos Guias Curriculares em atividades mais práticas. Foi assim que surgiram, então, dois anos mais tarde, os Subsídios para a Implementação do Guia Curricular de Matemática – Álgebra para o 1º grau – 1ª a 4ª séries, publicado em sua primeira versão no ano de 1977, sob a chancela da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo. Já nesses subsídios, a proposta era fazer com que o que estava posto no Guia Curricular pudesse ser implementado em sala de aula por meio de atividades mais reais e concretas. Para tanto, com a introdução de atividades com estruturas manipuláveis, como por exemplo os blocos lógicos, houve uma modificação no ensino do conceito de número, que anteriormente estava posto em ordem mais teórica, mas ainda preservando a essência das propostas iniciais. Assim, novos saberes foram sendo modificados em função da atividade docente, dando-nos indícios da elaboração de uma matemática tida como ferramenta para o ensino, em que os próprios elementos constitutivos do ensino de matemática aparecem em situações mais didáticas, considerando a ordem, a progressão e o encadeamento lógico das estruturas matemáticas (SÃO PAULO, 1977). Esse guia contou com diversas edições desde 1977 a 1979, tendo suas edições coordenadas por Lydia Condé Lamparelli, destinadas à matemática dos anos iniciais de escolarização.

Transcorridos dez anos da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases de 1971, Lydia Condé Lamparelli implementou uma pesquisa educacional[3]de âmbito estadual paulista para detectar possíveis problemas existentes no ensino de matemática. Essa pesquisa tomou como base saberes consubstanciados no Guia Curricular e seus subsídios, podendo assim ser possível ter um diagnóstico do ensino de matemática veiculado por uma década em escolas paulistas.

A primeira edição do material “Atividades Matemáticas” (1981), implementado a partir da pesquisa acima referida, foi publicado pela CENP teve como coordenadora a professora Lydia Condé Lamparelli, que também participou de sua redação. O material analisado contém 293 páginas, distribuídas em prefácio, instruções para o uso do texto, 128 atividades e um apêndice (folhas para recortar). As Atividades Matemáticas tiveram vida longa no ensino paulista, passando por diversas edições e reformulações.

Destinado à 1ª série do 1º grau, a proposta principal do material era subsidiar os professores na tarefa em que os alunos pudessem “trabalhar naturalmente com conceitos matemáticos, tendo liberdade de experimentar, discutir e sobretudo tirar conclusões” (SÃO PAULO, 1981, p.11). Os temas abordados nessa edição são os seguintes: vocabulário fundamental para a matemática, geometria, sequências, classificação, simbolização, número natural, sistema de numeração decimal, adição e multiplicação.

Em 2017, Lydia Condé Lamparelli autorizou a divulgação de parte de seu acervo pessoal[4]no Repositório Institucional da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), espaço virtual onde está depositado o material empírico que serve de fonte às pesquisas do GHEMAT. Nesse acervo digitalizado encontram-se 66 documentos de diferentes épocas e natureza variada, como por exemplo, livros destinados a professores editados em outras línguas (inglês e francês), materiais utilizados em cursos para professores, apostilas com conteúdo matemático, textos com conteúdo pedagógico, traduções, entre outros materiais destinados à formação de professores que tem subsidiado pesquisas de mestrado e doutorado em andamento.

Em suma, a expertise de Lydia Condé Lamparelli se deu em traduções, adaptações e autoria de livros didáticos; traduções de artigos e documentos sobre educação, psicologia, educação matemática, elaboração de guias curriculares, atendendo assim diversas demandas que o Estado lhe confiou e que estiveram presentes no ensino e na formação de professores.

 

Referências

 

ABRANTES, A.C.S.;AZEVEDO, N. O Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura e a institucionalização da ciência no Brasil, 1946-1966. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Série Ciências Humanas. Belém, v. 5, n. 2, p. 469-489, 2010.

ALMEIDA, A.F.; VALENTE, W.R. Os experts e a produção de saberes para a docência: primeiros estudos do acervo Lydia Lamparelli. Revista Linhas Críticas, v. 25, 2019, pp. 318-332.

HOFSTETTER, R. et al. Penetrar na verdade da escola para ter elementos concretos de sua avaliação – A irresistível institucionalização do expert em educação (século XIX e XX). Trad. Marcos Denilson Guimarães e Wagner Rodrigues Valente. In: HOFSTETTER, R.; VALENTE, W. R. (Orgs.). Saberes em (trans)formação: tema central da formação de professores. 1ª ed. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2017 (Coleção Contextos da

Ciência), p. 55-112.

HOFSTETTER, R.; SCHNEUWLY, B. Saberes: um tema central para as profissões do ensino e da formação. Trad. Vivane Barros Maciel e Wagner Rodrigues Valente. In: HOFSTETTER, R.; VALENTE, W. R. (Orgs.). Saberes em (trans)formação: tema central da formação de professores. 1ª ed. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2017 (Coleção Contextos da

Ciência), p. 113-172.

LAMPARELLI, L. C. Matemática: uma escolha anunciada de estudos e vida. Revista de História da Educação Matemática, v. 4, n. 2, 2018, p. 263-290.

LOPES, A. J.; MEDINA, D. Lydia Lamparelli – personalidade marcante, comprometida

com o ensino público. In: VALENTE, W, (Org.). Educadoras Matemáticas: memória,

docência e profissão – 1 ed. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2013.

SÃO PAULO. Secretaria da Educação. Guias curriculares para o ensino de 1º grau. São

Paulo, CERHUPE, 1975. 279 p.

SÃO PAULO. Secretaria da Educação. Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas. Pesquisa-avaliação sobre o ensino da Matemática. São Paulo, SE/CENP/CECISP, 1981.

280 p.

SOUZA, G. L. D. Educação matemática na CENP: um estudo histórico sobre condições

institucionais de produção cultural por parte de uma comunidade de prática. Campinas:

UNICAMP, 2005. Tese (Doutorado) – Faculdade de Educação, Universidade de Campinas,

Campinas, 2005.

VALENTE, W. R. Saber Objetivado e Formação de Professores: reflexões pedagógico-epistemológicas. História da Educação, v. 23, p. 1-22, 2019.

 

Notas

 

[1] O Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura (IBECC) foi criado em 1946 no Rio de Janeiro como Comissão Nacional da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) no Brasil. Em 1950 as atividades desse instituto estenderam-se para São Paulo, onde cientistas e educadores se engajaram em uma experiência inovadora em termos de divulgação científica e ensino de ciências, por meio de feiras, concursos, produção de material didático e kits de experimentação (ABRANTES, AZEVEDO, 2010, adaptação do autor).

[2]Uma cópia digital do Guia Curricular para o Ensino de 1º grau (1975) encontra-se hospedada em https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/196256. Acesso em 04/01/2022.

[3] Para informações mais detalhadas sobre essa pesquisa, consultar o artigo Avaliação do Sistema Escolar e a (Re)produção de Saberes por meio de Pesquisa Educacional: o modelo coordenado por Lydia Condé Lamparelli, de autoria de André Francisco de Almeida e Wagner Rodrigues Valente disponível em:

<https://aplicacoes.ifs.edu.br/periodicos/index.php/caminhos_da_educacao_matematica/article/view/724>. Uma cópia dessa pesquisa, um dos trabalhos de Lydia Condé Lamparelli como expertpode ser acessada em https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/196505.

[4]Para o Acervo Pessoal Lydia Condé Lamparelli consulte-se https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/173402/Indice%20Sumário%20Lydia_11_2018.pdf?sequence=3&isAllowed=y. Acesso em 05/01/2022/.

 

André Francisco de Almeida

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