OSVALDO PILOTTO
OSVALDO PILOTTO (1901-1993)
No contexto de experts da educação, apresenta-se Osvaldo Pilotto (1901-1993), professor e diretor da Escola Normal e da Escola de Professores ao longo de 24 anos (1922-1946) na cidade de Curitiba, além de outras funções[1], que muito contribuiu na formação de professores primários no estado do Paraná.
Nos anos iniciais da República, o currículo da Escola Normal era considerado inadequado aos seus objetivos, visto que havia poucas matérias que auxiliavam na formação pedagógica dos futuros professores. Os lentes do Ginásio Paranaense e da Escola Normal de Curitiba ministravam suas aulas para ambos os cursos, ao mesmo tempo, o que dificultava um olhar específico para a formação docente. No Código de Ensino de 1917, o curso normal apresentava, entre outras matérias, Aritmética, Desenho Linear, Geometria Plana, Desenho, Geometria do Espaço e Trabalhos Manuais, que estariam relacionadas com saberes matemáticos. Para a formação específica de professor eram indicadas as matérias de Pedagogia (parte geral) no 2.º ano, Pedagogia (parte especial) no 3.º ano e Prática Pedagógica, no 4.º ano, que pretendiam complementar o curso Normal com a parte pedagógica feita diariamente em escolas da capital sob a orientação e inspeção do lente respectivo. Surgia uma nova preocupação com a formação do professor, procurando fazer com que este tivesse a oportunidade de cursar uma matéria relacionada diretamente com a prática em sala de aula. No entanto, ainda não constavam as matérias de metodologias específicas, fato que ocorreu somente no ano de 1923.
Na década de 1920, as críticas que já existiam sobre a reduzida formação profissional e a ênfase dos estudos de cultura geral apresentados nos currículos das escolas normais ganhou um maior destaque. Inserido neste contexto, o estado do Paraná, com Cesar Prieto Martinez, inspetor geral da instrução pública do Paraná, iniciou uma ampla reforma de ensino, inaugurando a nova Escola Normal de Curitiba no ano de 1922.
O funcionamento da Escola Normal trouxe a necessidade de reorganização e revisão do regimento do curso. Assim, no ano de 1923, Lysimaco Ferreira da Costa, então diretor, após ter elaborado um novo regulamento para a Escola Normal, lançou as Bases Educativas para a Organização da Nova Escola Secundária do Paraná que traziam as determinações para a tal reforma.
A Escola Normal foi então organizada em dois cursos: o Curso Geral (três anos) e o Curso Especial (um ano e meio). O Curso Geral tinha como objetivo transmitir os conhecimentos que deveriam ser ensinados no ensino primário, assim como preparar a cultura geral do futuro professor. Já o Curso Especial seria a complementação do Curso Geral, com a formação pedagógica que iria especializar o (a) normalista para lecionar tanto no ensino primário quanto para normalistas.
Costa (1923) era contra a seleção de docentes por meio de concursos públicos. Para ele, era preciso uma total reforma do corpo docente, alegando que o critério de escolha não poderia ser o do concurso, pois era necessário que os professores tivessem certas condições para merecer a vaga.
A primeira reforma a se fazer é a do corpo docente, que deve ser radicalmente modificado, de modo que o diretor possa contar com lentes compenetrados de que, acima de suas opiniões individuais, quaisquer que sejam, estão os sagrados direitos da educação, e que, o sentimento da gravidade da nobre missão que aceitaram do Estado, lhes impõe hábitos de obediência, disciplina, modéstia, tolerância, observação, estudo e dedicação leal. (COSTA, 1923, p. 408)
Alegava que quem ensinava aprendia, não precisando o professor ter muito conhecimento. Costa (1923) considerava como mais importante para um docente as virtudes morais, desde que fosse inteligente, já que poderia desenvolver capacidade intelectual logo após o início de seu exercício. Desta forma, por meio do apoio do Presidente do Estado, Lysimaco Ferreira da Costa alterou a composição do corpo docente da Escola Normal, sendo nomeados somente os docentes “[...] comprometidos com o diretor do estabelecimento, com seu ponto de vista, partilhando ideias, posições políticas, ou que fizessem parte de suas relações pessoais, ex-alunos, enfim, pessoas de sua confiança” (ABREU, 2007, p. 116).
Dentre outros lentes, Waldomiro Teixeira de Freitas (Geometria) e Álvaro Pereira Jorge (Aritmética e Álgebra) foram dispensados das cadeiras da Escola Normal, permanecendo no Ginásio Paranaense. Para o lugar deles foi chamado Osvaldo Pilotto, com seus 21 anos, que se tornaria o mais novo professor da Escola Normal de Curitiba, convidado pelo então diretor Lysimaco Ferreira da Costa.
Para Valfrido Pilotto (1993), irmão de Osvaldo Pilotto, foi com a realização dos cursos da Escola Normal de Curitiba e da Escola Agronômica do Paraná que Osvaldo Pilotto ficou conhecido pelos renomados mestres da época. Além de ser conhecido, ele era admirado pelos seus mestres, conforme se verifica em seu relato, quando se refere ao seu primeiro dia de aula na cidade de Curitiba.
Quanto a mim, o que me pesou foi exatamente já existir, nas várias disciplinas, aquele Pilotto das arábias. Com nitidez me lembro quando, no primeiro dia de aula com Álvaro Jorge, este, ao deparar com o nome no livro de chamada, ergueu a cabeça, olhou-me fixamente, não reprimiu o seu tique de apertar um dos olhos, e perguntou: “É irmão do Osvaldo?”. Balbuciei uma resposta, compreendendo tudo, e ele retrucou, severo: “Vamos ver, então, se você não o desmoraliza”. (PILOTTO, 1993)
Dentre estes mestres, estava Lysimaco Ferreira da Costa que havia sido professor e diretor de Osvaldo Pilotto na Escola Normal. Assim sendo, pode ser que devido ao fato de ter sido um aluno admirado pelo então diretor da Escola Normal e de ter se formado engenheiro agrônomo, Osvaldo Pilotto tenha sido convidado para tal função. Além disto, pesquisa realizada por Rossano Silva (2014) nos diz que havia uma aproximação da família Pilotto com o governo paranaense, fato que indica certa facilidade para que tanto Osvaldo Pilotto quanto seu irmão Valfrido Pilotto assumissem cargos de destaque na esfera pública.
Silva (2014) relata que a chegada dos imigrantes europeus, principalmente alemães e italianos, entre os quais a família Pilotto, levou a sociedade paranaense do final do século XIX e primeiros anos do século XX, a uma configuração de mudanças que perpassaram as esferas política, econômica, cultural, social, religiosa e ética. A família Pilotto era de origem italiana e seus primeiros representantes brasileiros estiveram ligados à ferrovia. O pai de Osvaldo e Valfrido era chefe da Companhia Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande do Sul. Nesta época, a categoria dos ferroviários era a mais numerosa e organizada da cidade, devido ao fato de estarem em contato direto com trabalhadores de outros centros. Assim sendo, o convite para Osvaldo Pilotto ser lente e escrever a proposta do novo Curso Normal pode ter sido por conta de seu prestígio como ex-aluno do Curso Normal e do curso de Agronomia e/ou da proximidade que sua família tinha com o governo do estado (CAMARA, 2020).
De tal modo, Osvaldo Pilotto tornou-se professor das cadeiras de Aritmética, Geometria, Álgebra, Metodologia de Geometria e Metodologia de Aritmética da Escola Normal de Curitiba no ano de 1923 (https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/125257) [2]. Ao contratar os novos docentes, Costa solicitou também que escrevessem um manual com a proposta de ensino que seria utilizada na formação dos professores. Ao realizar tal solicitação, foi indicado aos autores que eles deveriam seguir a metodologia de Juan Patrascoiu[3], obra que somente foi finalizada no ano de 1926 e que trazia na capa a seguinte informação “Traduzida da Methodologia de Patrascoiu e ampliada e adaptada aos programas do Estado do Paraná”. Isso posto, Osvaldo Pilotto escreveu dois capítulos intitulados “Methodologia de Geometria” e “Methodologia de Aritmética” (https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/127309) que compunham o material para ser utilizado na formação dos futuros professores primários.
Sendo assim, Osvaldo Pilotto auxiliou com relação à objetivação de saberes relacionados ao ensino da Matemática, mais especificamente, no que tange aos saberes para ensinar na Escola Normal, ao trazer o ensino analítico e intuitivo para as práticas de ensino e às matérias de metodologias relacionadas com os saberes para ensinar, destacando-se tanto pela docência e produção escrita quanto pela participação em grupos políticos, educacionais e sociais. Ocorreu, ainda, após o convite para iniciação de sua docência na Escola Normal, o convite para a Direção da Escola Normal de Curitiba e da Escola de Professores, além de outras funções, como diretor da Escola de Belas Artes e da Biblioteca Pública do Paraná, o que pode ser entendido como reconhecimento de seus pares em relação ao seu papel como educador.
Referências
ABREU, G. S. A. de. A trajetória de Lysimaco Ferreira da Costa: educador, reformador e político no cenário da educação brasileira. (Final do século XIX e primeiras décadas do século XX). 2007. Tese (Doutorado em Educação) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC), São Paulo, 2007. Disponível em: https://tede2.pucsp.br/handle/handle/10591. Acesso em: 02 fev. 2021.
ANJOS, J. J. T. dos. A hemeroteca professor Osvaldo Pilotto, na biblioteca do museu paranaense: um acervo para as pesquisas em história da educação do Paraná (1857-1946). In: CONGRESSO NACIONAL DE EDUCAÇÃO – EDUCERE, 10., 2011, Curitiba. Anais [...]. Curitiba: Pontifícia Universidade Católica do Paraná, 2011. Disponível em: https://educere.bruc.com.br/CD2011/pdf/4319_2372.pdf. Acesso em: 02 fev. 2020.
CAMARA, A. Osvaldo Pilotto das Arábias e a Geometria para ensinar na Escola Normal de Curitiba (década de 1920). REMATEC, v. 15, n. 34, p. 92-104, 1 set. 2020.
MORENO, J. C. Inventando a Escola, Inventando a Nação: Discursos e Práticas em torno da escolarização Paranaense (1920-1928). 2003. Dissertação (Mestrado em Educação)- Setor de Educação, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2003.
PARANÁ. Código do Ensino do Estado do Paraná. Documento aprovado pelo Decreto n. 17 de 9 de janeiro de 1917, assinado por Enéas Marques dos Santos. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/125257. Acesso em: 05 jan. 2020.
PARANÁ. Bases Educativas para Organização da Nova Escola Normal Secundária do Paraná. Lysimaco Ferreira da Costa. Curitiba, PR, 1923. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/123699. Acesso em: 02 fev. 2021.
PILOTTO, O. Methodologia de Geometria. In: Metodología aplicada: métodos de enseñanza (versão traduzida de J. Patrascoiu por Osvaldo Pilotto). Biblioteca Pública do Estado do Paraná, 1926. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/127309. Acesso em: 02 fev. 2021.
PILOTTO, O. Methodologia de Aritmética. In: Metodología aplicada: métodos de enseñanza (versão traduzida de J. Patrascoiu por Osvaldo Pilotto). Biblioteca Pública do Estado do Paraná, 1926. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/127309. Acesso em: 02 fev. 2021.
PILOTTO, V. Evocando o prof. Osvaldo Pilotto, cuja memória engrandece o magistério paranaense. Gazeta do Povo, 10/08/1993.
SILVA, R. Educação, arte e política: a trajetória intelectual de Erasmo Pilotto. 2014. Tese (Doutorado em Educação) – Setor de Educação, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2014. Disponível em: https://acervodigital.ufpr.br/handle/1884/37029. Acesso em: 02 fev. 2020.
Notas
[1] Pesquisa realizada por Anjos (2011) apresenta a hemeroteca professor Osvaldo Pilotto, na biblioteca do museu paranaense, que trata de um acervo importante para as pesquisas em história da educação do Paraná.
[2] No Art. 193, do Código do Ensino do Estado do Paraná (1917), consta: “Os programmas de ensino serão, sobre cada materia, organizados pelos lentes e professores [...]”.
[3] Pesquisas desenvolvidas por Abreu (2007) e Moreno (2003) mostram que a Reforma foi marcada pelas observações que Lysimaco Ferreira da Costa realizou em visitas às Escolas Normais da Argentina. Costa, por ser representante do estado para o comércio da erva-mate e também como educador, mantinha diálogo com a Argentina. Em função dessas relações, o pedagogo argentino Juan Patrascoiou, adepto às concepções de Herbart, acabou o influenciando nas reformas da Escola Normal do Paraná.
Alexsandra Camara